quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

Ainda a mensagem de Natal do nosso 1.º

Capa do jornal i de ontem: "Passos Coelho pede renúncia ao pessimismo na mensagem de Natal." Eu parei em "renúncia". Afinal, aproxima-se a hora dos desejos para 2013. Era uma passa abençoadinha.

sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Taxista... mas pouco

Devo confessar que não sou grande fã de andar de táxi em Lisboa. Talvez pelas (demasiadas) más experiências que tive ou pelo simples facto de que todas as bestas quadradas que têm por profissão conduzir um táxi serem, precisamente, aqueles que me vêm calhar em sorte/azar. Já me aconteceu de tudo um pouco: desde taxistas a fazerem rali a 200 à hora, como se estivessem no autódromo do Estoril e eu não estivesse sentada no banco de trás, a senhores que além de conduzirem demasiado depressa gostam de fazer razias aos outros condutores enquanto berram impropérios, seja na estrada ou a estacionar, como que a mostrar a sua parca virilidade sebosa, taxistas ucranianos a operar no centro de Lisboa, que não sabem onde estão nem para onde vão, taxistas de idade avançada a mandar vir comigo muito indignados porque tive a terrível ousadia de lhes pedir uma factura quando ainda não tinham estacionado o carro no destino. Houve um até, aqui há uns anos, que me assustou de tal forma que nunca mais vou esquecer. Apanhou-me no Parque das Nações, depois de uma noitada entre amigos, já de madrugada, e veio o caminho todo, que ainda foi longo, a fazer-se a mim e a convidar-me para ir sair com ele e beber uns copos. "Paniquei". Estava sozinha e o assédio foi de tal ordem que vim o caminho todo de telemóvel na mão pronta a ligar à PSP ao mínimo sinal de alarme e cheguei, até, a inventar um marido (ou noivo, já nem sei bem) inexistente à data, que estaria à minha espera em casa, embora ninguém lá estivesse. Mas aquilo que me irrita mais, que me tira do sério até dizer chega, são os taxistas que não sabem o caminho e me perguntam, com a maior das latas: "então e como é que quer ir para lá?". Pensava que isto só acontecia em Frankfurt, onde todos os taxistas são useiros e vezeiros a fazê-lo e, ainda por cima, são pagos a peso de ouro. O preço é de ouro, mas o serviço de pechisbeque, entenda-se. Curiosamente, no meu trabalho como tradutora, nunca perguntei ao cliente "Então e como é que quer que eu traduza? Quer assim, assado, cozido ou frito?", porque parto do princípio, absolutamente palerma, de que é suposto saber fazer o meu trabalho, até porque estudei 20 anos da minha vida para isso. Picuinhices! Ora se eu entro num táxi é porque, à partida, preciso de ir a algum lado e não tenho outro meio para o fazer, pelo que, confio que um profissional o faça. Erro crasso, evidentemente. Passo a reproduzir o diálogo que se estabeleceu entre mim e a senhora taxista com ar de toxicodependente que me apanhou há pouco: "É para a Quinta Barros, na Rua X.", digo eu. "Quinta Barros?", pergunta muito surpresa, como se eu tivesse dito que era para me deixar ali no Burkina Faso. (A rua ficava a 5 minutos ou menos de onde nos encontrávamos, dependendo do grau de competência do condutor.) "Sim, nessa zona, na Rua X.", digo. One million dollar question: "Então e por onde é que quer ir?" (Tchanã! Pimbas, toma lá!) "Não importa. Desde que chegue lá.", respondo já com vontade de lhe espetar uma chapada nas trombas. "Quinta Barros? Quinta Barros? Pois, é que isso, não sei... Isso é ali pelo Hospital de Santa Maria, não é?" (A vontade de lhe ir ao trombil aumenta.) "Sim, é perto, mas fica mais perto das Torres de Lisboa. É a Rua X.", insisto. "Ahhhhhhh, pois não sei. Então, podemos fazer assim? É que podemos ir por ali, por ali ou por ali. Como é que quer fazer?" (Nem respondo, tal não é a minha indignação.) "Podemos então ir pelo Hospital de Santa Maria e depois logo se vê." (O GPS está colado ao vidro no táxi, mas só agora a senhora parece ter-se apercebido de que ele existe. Começa a teclar o nome da rua, enganando-se no dito, como já esperava. Bufo de impaciência, mas como tenho pressa e não há mais táxis à vista, não tenho remédio se não aguentar a provação e esperar.) "Isto é só para me certificar de que estamos a ir bem, porque eu estou a ver a zona, sim.", diz ela, fingindo que conhece o sítio. (Claro, e eu sou o Pai Natal, penso.) "Então e quando vai para lá, como é que costuma ir?", pergunta a senhora taxista. (Sem comentários.) Aproximamo-nos, por fim, da zona, embora ainda não seja ali. "Pronto, chegámos.", afirma, orgulhosíssima. "Não, não chegámos.", respondo. "Não é aqui." "Então mas a rua é aqui e devemos estar a chegar ao número da porta que disse." "Não, nem é esta a rua nem vejo nenhum número 28 aqui." "Ah, então espere lá. Vamos experimentar ali. (Pergunto-me para que servem os GPS e se, de facto, seguiu as instruções dadas.) "Então é aqui.", continua. "Não, também não é aqui.", respondo já enfastiada de mais para o esconder. "Então vamos ali." "Mas não é aqui!", digo, tentando manter a pouca calma que me resta. "Pois, mas vamos por aquela rua de dentro, como eu disse." Mais uma vez, para na porta errada. "Pronto, estamos aqui no 31, 29... Então é aqui.", afiança. "Não, aqui são números ímpares e eu quero ir para o 28, por isso tem de ser do outro lado!" "Ahhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh!", responde muito admirada. (Alguém explique à senhora que, na maior parte dos países civilizados, incluindo Portugal, os pares e os ímpares ficam em lados opostos da rua e não lado a lado.) Finalmente chegamos. Nem quero acreditar. Haja pachorra!

quinta-feira, 19 de julho de 2012

Über clichés

Hoje tropecei num über cliché que há muito não ouvia/lia: "Ser amigo do seu amigo". De todos os über clichés que conheço, tenho três de eleição: o que acabei de referir, "ser uma pessoa muito humana" (tão bom!) e, por fim, o velhinho "Carpe Diem", para a malta nascida nos anos 70 e 80, cujo único filme de jeito que viu na vida terá sido o "Clube dos Poetas Mortos", quando passava na RTP1, em mil nove e troca o passo. A maior utilidade de um über cliché é saber com que tipo de pessoa lidamos. Se alguém tiver no seu perfil ou mural facebookiano alguma destas três frases, saberemos de imediato que o nível de conversa que podemos ter com a pessoa em questão terá a profundidade das águas da barragem de Castelo de Bode em Agosto. Podemos guardar a conversa sobre as filosofias niilistas de Nietzsche para outros futebóis e largar um bitaite sobre a última contratação do Benfica, sem receio de receber um olhar de desprezo incrédulo. Über clichés 4ever! E "prontos"!

sexta-feira, 18 de maio de 2012

Dépaysement auf Deutsch

Os franceses têm palavras giras e de difícil ou impossível tradução. Uma delas é "engagé", no que à política ou de quem dela vive diz respeito, outra é aquela sobre a qual escrevo estas linhas: "dépaysement". Há muito que me faltavam as oportunidades de voltar a falar francês com falantes nativos, não que não me cruze diariamente com largas dezenas deles pelos corredores da empresa, onde o inglês, por ser a língua oficial, nos deixa a todos cair no facilitismo de adoptar a norma e voltar costas ao que há muito aprendemos. Nos últimos dias acabei de ler o último livro de Amélie Nothomb, "Tuer le Pére", vi o filme "La Guerre est déclarée", de e com Valérie Donzelli, e fui, sem estar minimamente à espera, convidada para jantar com amigos que, por acaso, pertenciam a uma turma de francês e a respectiva professora, francesa de gema, que não conhecia de lado nenhum. Já se passaram 11 longos anos desde a minha última aula de francês, no 3.º ano da minha licenciatura, mas a verdade é que, alguma ferrugem à parte, já sentia saudades de falar outra língua que não o inglês, nem que fosse só por algumas horas, naquela esplanada do restaurante vietnamita numa noite de de muito calor na zona de Nordend. Tudo isto para dizer que, do nada, comecei a tropeçar em palavras já semi-esquecidas como a que intitula este relato. A pouco mais de um mês de um regresso a Lisboa por cinco semanas para trabalhar num projecto da empresa que me vai obrigar a assentar arraiais e montar quartel-general na capital durante mais tempo do que gostaria, o meu cérebro divide-se: por um lado, vai ser bom poder ver amigos e família nos (poucos) dias em que não esteja a trabalhar, ir aos meus restaurantes e bares preferidos nas horas vagas, comer as minhas iguarias preferidas, ver se os sítios de que gostava há dois anos, antes de emigrar, ainda existem ou mudaram muito entretanto, voltar a perder-me nas lojitas do Bairro Alto, ponto de paragem obrigatório em qualquer visita a Lisboa, almoçar no Chiado num dia de calor, ir a Belém admirar a beira-rio, conhecer os sítios novos que ainda não tive oportunidade de visitar, sair à rua e ver sol, sol e mais sol, em vez do tempo esquizofrénico da Europa Central a que me tive de me resignar. Por outro lado, não consigo evitar a sensação de que já pouco ou nada pertenço ao meu país. Uma das grandes vantagens de se trabalhar numa multinacional em que quase todos somos expatriados é que a grande maioria das pessoas vive como se de um Erasmus em idade (mais) adulta se tratasse. Ninguém tem filhos, muito poucos são os casados, sai-se imenso, poucas são as semanas em que não há festas em casa deste ou daquele ou jantares neste ou naquele restaurante. Para quem, como eu, sempre carregou a mágoa de não ter podido fazer Erasmus por falta de condições financeiras, isto sabe mesmo muito bem. Que me perdoem os meus amigos casados ou juntos (que já são a maioria), com filhos maravilhosos e vidas organizadas em função da família, mas voltar a Portugal é ter a certeza de que o meu lugar não passa por aí. Compreendo, louvo e aceito, mas reservo-me o direito de preferir outra coisa. Vou sentir falta da beira-rio em Sachsenhausen nos poucos dias em que o sol nos agracia, dos jantares em Bornheim e em Nordend, dos cocktails do Nachtleben e naquele bar em frente ao Hooters que nunca sabemos o nome, de passear pelas montras da Berger Strasse, dos "lapsus linguae" a que estou sujeita por não falar alemão, do professor de alemão que fala comigo em espanhol e italiano, do italiano que comigo frequenta o curso, estúpido que nem um calhau e a quem só me apetece espetar um murro na tromba, dos amigos, dos colegas, da minha casa, de me sentar no Grüneburgpark a fazer um piquenique e de comer um belo "brunch" na Maison do Pain. Bem sei que serão só cinco semanas e que vão passar a correr, mas o "dépaysement" já ataca. Ele há coisas...